Setor tem preconceitos enraizados, porém já existem diversas iniciativas para mudar esse cenário e tornar o mercado mais receptivo para todos
A presença feminina nos canteiros de obras e demais posições da construção civil está crescendo, porém elas ainda enfrentam diversos obstáculos no setor — com destaque para o preconceito. Esse tipo de discriminação foi indicado como grande fator limitante para atuação das mulheres nesse mercado por 77% dos entrevistados em pesquisa elaborada pelo Portal AECweb e Sienge Comunidade. O levantamento destaca, também, outros pontos de atenção como os ambientes majoritariamente machistas, networking dominado por homens e poucas lideranças femininas.
De acordo com o trabalho, para ser mais inclusivo e atraente, o segmento deve buscar melhor equidade salarial, total apoio à licença-maternidade e um número maior de vagas. Além disso, 53% acreditam que existem oportunidades no mercado para as mulheres em todos os cargos e posições disponíveis. Já 73% do público ressalta que as profissionais estão conquistando mais espaços nas lideranças da construção. Os dados da pesquisa foram compilados em um e-book.
De maneira resumida, a percepção é que existem problemas a serem resolvidos para que as mulheres tenham mais oportunidades na construção. Porém, o setor já conta com diferentes iniciativas e práticas em prol da diversidade para tornar esse segmento muito mais inclusivo.
Atrair o público feminino para atuar na construção passa por atitudes tanto públicas quanto privadas — sendo que em ambos já existem boas-práticas a serem seguidas. Em 2017, por exemplo, a Prefeitura de Guarapuava, no Paraná, aprovou lei que exige que as empresas desse setor que prestam serviços para a cidade possuam, no mínimo, 10% de suas vagas preenchidas por mulheres. “Percebemos que havia uma resistência do mercado empregador em contratar mulheres para construção civil porque elas ainda não têm a experiência necessária para tocar uma obra. Assim, vimos a necessidade de uma política pública de inclusão”, destacou Priscila Schram, secretária da Mulher na época, em entrevista concedida ao telejornal Paraná TV.
Já no âmbito nacional, o Executivo Federal criou em 2022 o Programa Emprega + Mulheres, que encoraja a inserção do público feminino no mercado de trabalho. Entre os estímulos oferecidos estão a flexibilização da jornada para mães com filhos de até seis anos ou com deficiência; período de 60 dias de licença-maternidade nas empresas cidadãs; seis dias para o companheiro acompanhar a mulher grávida nos exames e consultas; e determinação para que o salário de mulheres e homens seja equivalente quando ambos exercem a mesma função. Com isso, o programa visa amparar o papel da mãe na primeira infância dos filhos e promove a ascensão profissional das mulheres, estimulando a presença delas em cargos estratégicos.
No setor privado, diferentes empresas da construção civil adotam práticas para aumentar a presença feminina em seus quadros de colaboradores. São os casos da Gerdau, que tem como meta alcançar 30% de mulheres em posições de liderança até 2025, e a Alcoa, que promove ações como o programa de aceleração de carreira Advance e o grupo de inclusão Rede de Mulheres para elevar a equidade de gênero e colocá-las cada vez mais em cargos estratégicos.
Já o Grupo Saint-Gobain é signatário, desde 2021, do Women’s Empowerment Principles (WEPs) — conjunto de princípios que tem como objetivo orientar as empresas a estimular o empoderamento feminino e a igualdade de gênero nos locais de trabalho. Além disso, a companhia foi contemplada em 2022 (e pelo quarto ano consecutivo) pelo índice Bloomberg Gender Equality. Tal conquista reforça o compromisso em prol da diversidade na empresa, que quer ter 30% de mulheres na liderança e 30% de mulheres nos Comitês Executivos até 2025.
Destaque, ainda, para o terceiro setor com trabalhos como o da ONG Mulheres em Construção, que desde 2006 atua para incluir o público feminino nesse mercado. A entidade oferece cursos e as qualifica para as mais diferentes atividades. Das mais de 6 mil mulheres formadas nos treinamentos, cerca de 40% foram contratadas formalmente pela construção civil e outras 28% são autônomas. Mais recentemente, a ONG tem atuado para auxiliar as vítimas das enchentes no Rio Grande do Sul, ampliando o número de turmas na região para capacitação em reparos, hidráulica, elétrica, pintura e outros serviços similares. Assim, além de aumentar a oferta de mão de obra para trabalhar na reconstrução do estado, a entidade também traz oportunidades para as famílias que perderam tudo nas chuvas terem um ponto de partida nesse recomeço.
Vale lembrar que incentivar a igualdade de gênero, além de ser ato de humanidade, está em acordo com as 17 metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da ONU.
Além das mulheres, a construção civil precisa ter atenção com outros grupos minoritários para, de fato, promover plenamente a diversidade e a inclusão. É o caso, por exemplo, da justiça racial — com muitos trabalhadores que atuam no setor se autodeclarando pretos ou pardos, mas com a parcela mais significativa desse público atuando em cargos operacionais e poucos nas posições de gerência. Uma das construtoras que percebeu esse cenário foi a MRV, que agiu para reverter a situação. A empresa construiu um programa afirmativo de trainees exclusivo para pessoas negras, que visa preparar esses profissionais para assumirem cargos estratégicos.
A MRV também promove iniciativas de sensibilização e conscientização contra a homofobia. Entre essas ações estão o custeio para retificação da documentação dos colaboradores que são pessoas trans, a criação de banheiros inclusivos (com glossário da diversidade em cada cabine e QRcode para divulgação de conteúdos educativos relacionados ao tema) e a concepção de um canal confidencial para denúncias de casos de desrespeitos, assédios ou discriminações.
Construtoras e demais empresas desse mercado podem adotar diversas iniciativas para promover a diversidade e a inclusão. Conheça, na lista abaixo, algumas dicas práticas.