Explorando o papel crítico da arquitetura moderna na luta contra a crise climática, entenda em detalhes como práticas inovadoras e sustentáveis podem transformar nossas cidades e reduzir o impacto ambiental.
Arquitetos e urbanistas têm papel relevante na tarefa de reduzir os efeitos nocivos provocados pelas mudanças no clima. Entenda como
Relatório da Organização Meteorológica Mundial (OMM) mostra que 2023 teve temperatura média acima dos padrões registrados nos últimos 174 anos. O documento destaca que até o mês de outubro, a superfície global estava 1,4°C mais quente em relação ao intervalo entre 1850 e 1900. Anteriormente, esse recorde pertencia a 2016, quando o aumento registrado foi de 1,29°C. Outra informação presente no trabalho que merece atenção é que os nove anos com as temperaturas mais altas da história estão todos no intervalo recente de 2015 a 2023.
A situação no Brasil não é diferente, de acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). O órgão comunicou que 2023 foi o ano mais quente de toda a série histórica, com 0,69°C acima da média. Além disso, de todos os 12 meses daquele ano, nove tiveram as suas temperaturas acima dos padrões — com destaque para setembro que teve o maior desvio (1,6°C). Ainda segundo o instituto, foram nove episódios de ondas de calor no país em 2023.
As mudanças climáticas são uma realidade e não estão restritas, apenas, ao aumento das temperaturas. A situação vem acompanhada de outros fenômenos que se mostram cada vez mais frequentes, como as fortes chuvas que provocam alagamentos em cidades de variados portes. Nesse sentido, arquitetos e urbanistas têm papel de protagonismo na missão de amenizar os efeitos dessa crise e tornar as metrópoles mais confortáveis para se viver.
Repensar e renovar as cidades são ações importantíssimas diante dos desafios atuais. Essas alterações, porém, já devem considerar as projeções para o futuro visto que a velocidade das mudanças climáticas vem em uma crescente. Pensando nas enchentes, por exemplo, é possível adotar como solução para auxiliar na drenagem o aumento na quantidade de áreas permeáveis — o que pode ser alcançado com a construção de telhados verdes ou de jardins de chuva.
Amplificar a presença da vegetação em meio ao cinza das ruas e edifícios traz benefícios que vão além da menor incidência de alagamentos. As árvores também têm papel ativo na redução das temperaturas. Estudo do Instituto de Saúde Global Barcelona (ISGlobal) revelou que se as áreas verdes fossem ampliadas de 15% para 30%, seria possível reduzir as mortes relacionadas ao calor extremo em um terço. Para chegar a essa conclusão, o órgão analisou os dados de 93 cidades europeias durante o verão de 2015, quando 6,7 mil pessoas morreram devido ao clima.
Os pesquisadores fizeram, também, simulações de como teria sido esse período caso as metrópoles tivessem o dobro de suas áreas verdes. O resultado mostrou que a média de temperatura desses locais seria 0,5°C menor em relação ao que realmente foi registrado.
Outra vantagem da vegetação é a melhora na qualidade do ar por meio da absorção de poluentes como o carbono. Ainda no quesito de emissões de gases do efeito estufa, o urbanista pode conceber soluções para melhorar as redes de transporte público, reduzindo a quantidade de carros nas ruas e, consequentemente, a queima de combustível. Exemplo que pode ser seguido é o de Curitiba, que apostou em um sistema inovador de ônibus BRT.
Além da participação macro na organização das cidades, arquitetos também podem contribuir para amenizar os efeitos das mudanças climáticas por meio de boas práticas na concepção de seus projetos de edificações. Tudo começa com a especificação de soluções construtivas com menores pegadas de carbono. Para entender se um material está ou não nessa lista, é preciso analisar como esse produto é fabricado, qual é sua matéria-prima e como acontece a extração desse insumo, como será o processo de descarte e se trata-se de bem passível de reciclagem.
Com base nessas respostas, algumas das opções com os melhores desempenhos são terra, madeira, bambu e areia. Por outro lado, entre as alternativas que devem ser evitadas, estão o aço, a cal e o cimento. Para colaborar com o profissional responsável pela seleção, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) lançou um guia com diferentes sugestões para a execução de canteiros de obras, espaços públicos e edificações mais verdes — sempre levando em consideração o contexto da construção civil brasileira. O material está disponível aqui.
Investir em energias renováveis é outro diferencial que pode fazer parte do projeto. Afinal, optar pelas fontes limpas reduz a dependência da queima de combustíveis fósseis que emite CO2 na atmosfera. Nesse sentido, o arquiteto tem a possibilidade de incorporar nas obras os sistemas fotovoltaicos — tecnologia em crescimento no Brasil. De acordo com a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), esse tipo de energia responde por 13,1% da matriz elétrica nacional, sendo que os sistemas residenciais geram 78,9% desse montante.
Ainda no aspecto da energia, existem soluções de projeto que proporcionam economia. É o caso da ventilação cruzada, que auxilia no conforto dos ambientes e diminui a necessidade de equipamentos de ar-condicionado. O bom desempenho térmico também pode ser alcançado com a implantação de materiais isolantes, como as lãs de vidro. Privilegiar a iluminação natural é outra prática que reduz o uso de eletricidade ao mitigar a demanda pelas luzes artificiais.
Apostar em áreas verdes também é importante dentro das edificações. Esses espaços com a presença de vegetação podem ser criados em ambientes de lazer — como nas churrasqueiras e piscinas —, ou então, em jardins tradicionais ou verticais. Existem, ainda, outras maneiras de trazer a natureza para mais dentro dos empreendimentos, por exemplo, com fachadas verdes.
Se preocupar com as mudanças climáticas é fundamental em todos os setores. Projeções de especialistas publicadas na revista The Lancet mostram que se a temperatura média do planeta aumentar 2°C até o final do século, espera-se que as mortes anuais causadas pelo calor cresçam 370% até 2050. Além disso, tal alteração teria o potencial devastador de aumentar o nível do mar, provocar mais tempestades e ondas de calor, além de ameaçar ecossistemas e intensificar episódios de secas — interferindo, assim, na segurança alimentar da população.