Construção Sustentável | 10 de novembro de 2023

O que são bairros circulares?

Explore o potencial dos bairros circulares na criação de comunidades sustentáveis e resilientes, aplicando práticas da economia circular para transformar as cidades em modelos de desenvolvimento sustentável.

Aplicar soluções localizadas e em escalas menores pode ser um caminho para tornar as cidades mais sustentáveis e inteligentes. Entenda como!

 

Os bairros circulares são distritos que conseguem incorporar todos os princípios da economia circular dentro dos seus limites, proporcionando o desenvolvimento sustentável local e o bem-estar à sua comunidade.

Esse tipo de projeto tem como foco reduzir os desperdícios, controlar a poluição, usar fontes de energia renováveis e promover a circulação local de produtos e materiais dentro de uma esfera mais localizada.

Quando os conceitos são aplicados em escala menor, fica muito mais fácil monitorar as atividades, identificar os desafios, as necessidades e as oportunidades e fazer adaptações, além de criar uma governança mais responsiva e abrir espaço para a inovação dentro dos próprios bairros.

“O conceito de bairros circulares se fundamenta nos princípios do desenvolvimento sustentável aplicados aos bairros, que já é disseminado por fundações como a Ellen Macarthur Foundation e pela própria ONU, que recentemente fez uma cartilha para divulgar sua proposta pelo mundo. Apesar de ser recente, se baseia em elementos antigos, que tentam associar o desenvolvimento sustentável à escala local do bairro”, explica Matheus de Vasconcelos Casimiro, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).

Laboratórios vivos

Uma das principais vantagens da aplicação do conceito de circularidade nos bairros é poder testar, em uma escala menor e mais segura, todas as abordagens da economia circular, que prioriza o desenvolvimento econômico a um melhor uso dos recursos naturais.

Isso porque um bairro pode ser considerado grande o suficiente para representar o comportamento da comunidade e as interações com os sistemas urbanos. Por outro lado, por estar em uma escala menor do que as cidades, fica mais fácil definir quais são as necessidades do projeto e mobilizar os cidadãos e comerciantes locais em torno dele.

Casimiro ressalta, no entanto, que os bairros circulares não se inserem especificamente em um conceito urbanístico. “O que temos, na verdade, são exemplos de projetos que procuram ser disseminados em vários lugares do mundo a partir de uma perspectiva eurocêntrica, ou seja, do entendimento dos europeus e do seu contexto sobre como eles podem atingir essas medidas de desenvolvimento sustentável na escala local”, explica.

Ainda segundo o professor do Mackenzie, o foco desse conceito está na importância da localidade. “O debate se pauta na perspectiva de que as grandes soluções para as cidades estariam na escala dos bairros e dá ênfase para resolver as questões com participação popular e com soluções locais particulares à realidade de cada distrito. Outros pontos são a adoção de medidas sustentáveis, como o controle de desperdício, seja de lixo ou de água, por exemplo, e o olhar específico para a importância das estruturas naturais, sejam córregos e vegetações na escala do lote e da rua”, completa.

Fundamentos

Segundo a Ellen Macarthur Foundation, o conceito de bairro circular se fundamenta nas seguintes premissas:

– Combate ao desperdício e à poluição;

– Incentivo à circulação de materiais no próprio local;

– Recuperação dos sistemas naturais.

Todas essas medidas, observa Casimiro, já constatam em outros documentos que tratam da aplicação do conceito focado na escala local.

“De certa forma, as premissas pensadas já estão na pauta da ONU e estão sendo discutidas em âmbito mundial. O que está sendo colocado à tona é como, no contexto das cidades europeias bem desenvolvidas, essas medidas estão sendo aplicadas nos bairros”, explica.

Aplicação

De fato, os principais exemplos de aplicação dos conceitos da circularidade estão nas cidades europeias, geralmente em bairros pequenos, já estruturados como unidades muito consolidadas e com comunidades bastante engajadas.

“Vários exemplos citados, portanto, não são inovadores, mas trazem atendimentos pontuais aos conceitos de bairros circulares”, conta o professor.

Ainda não há nenhuma iniciativa de projeto com essas premissas em curso no Brasil. E as razões para isso são diversas, a começar pela escala urbana local, muito diferente da europeia.

“Nossos bairros não são unidades de desenvolvimento independentes das cidades. Há muitos bairros, sobretudo nos subúrbios, que são estritamente residenciais e cuja dinâmica de vida das pessoas não se restringe a ele. Sem contar que as condições já existentes com relação ao desperdício, poluição e existência de elementos naturais são muito diferentes. Muitos bairros são precários nesses quesitos. Então podem existir práticas consagradas de melhorias pontuais, mas não medidas organizadas e sistematizadas em cima do conceito de bairro circular”, observa.

Exemplos europeus

Fora do Brasil, no entanto, algumas iniciativas têm sido muito bem-sucedidas. Confira exemplos de aplicação dos conceitos de circularidade nos bairros na Europa:

Nodhavn Copenhagen – Dinamarca

Essa área portuária localizada na cidade de Copenhagen, na Dinamarca, já está sendo redesenhada para se tonar um bairro circular.

Com soluções sustentáveis para energia, meio ambiente, transporte e paisagem urbana, o distrito urbano pretende acomodar 40 mil novos residentes e 40 mil locais de trabalho, tudo dentro dos conceitos sustentabilidade e habitabilidade.

A ideia é transformar essa área da capital dinamarquesa em uma “cidade de cinco minutos”, permitindo que seus residentes acessem serviços e equipamentos urbanos e culturais andando cinco minutos a pé de qualquer estação de metrô.

O bairro também contará com várias fontes de energia renovável, com um sistema de drenagem dupla e um sistema central de sucção de resíduos.

Uma série de projetos locais, como as das premiadas escolas Copenhagen Internacional, por exemplo, contarão com soluções de fachadas, paredes internas, isolamento e tetos Gyptone, da Saint-Gobain.

Buiksloterham – Holanda

Essa área, localizada nos arredores industriais de Amsterdã, na Holanda, se tornou um laboratório vivo de desenvolvimento urbano circular sustentável.

O projeto se destaca pelo uso inteligente de materiais, reciclagem, energias renováveis, resiliência climática e mobilidade sustentável.

Os residentes foram encorajados a participar diretamente do novo processo de construção do projeto por meio da mídia social. Ao todo, estima-se que 6,5 mil pessoas trabalhem em Buiksloterham e mais de 8 mil trabalhem nas suas proximidades.

O resultado da aplicação do conceito de circularidade impulsionou a economia local e renovou uma antiga área industrial, que passou a ser um atraente distrito urbano.